Organizações de imigrantes, Centrais Sindicais, Sindicatos e Sociedade Civil protestam contra política desumana de expatriação adotada pelo presidente americano
Por Fábia Medeiros. Edição Jaqueline Bertoldo
9.fev.2025
Aconteceu nesta sexta-feira (7), na Câmara Municipal de São Paulo, no Auditório Sérgio Vieira, o "Ato Político Contra as Deportações de Migrantes pelo Governo Trump". O objetivo do encontro se deu em virtude da forma indignante como os brasileiros chegaram ao país no último dia 24 de janeiro. Os nacionais desembarcaram na capital mineira algemados e acorrentados. Conforme relatos, os passageiros foram tratados de forma violenta pelos agentes americanos. Vale lembrar que a Declaração Universal dos Direitos Humanos garante, no artigo XIII a liberdade de circulação e assegura, no artigo V, que ninguém será submetido a tratamentos degradantes.
Participaram do debate representantes das organizações parceiras, das comunidades de imigrantes e da sociedade civil, e contou com a presença da vereadora Luna Zarattini e do deputado federal Carlos Zarattini. O debate foi mediado por Paulo Iles, diretor executivo da Rede Sem Fronteiras e do CDHIC, e ativista de Direitos Humanos.
Durante a abertura, Paulo destacou o pioneirismo do governo de Fernando Haddad (2013-2016) à frente da Prefeitura de São Paulo, quando foi instituída a Coordenação de Políticas para Migrantes do País, no âmbito da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC).
APRESENTAÇÕES e MANIFESTOS
O deputado federal Carlos Zarattini iniciou a sua fala lembrando das lutas que vem travando desde os idos de 2007, quando da obtenção da anistia aos imigrantes irregulares no Brasil, e em 2017 com a aprovação da Nova Lei de Migração (Lei 13.445). Zarattini também destacou o crescimento da extrema direita mundial e condenou as práticas violentas e racistas adotadas pelo atual presidente americano. “É um clima de terror que se instalou nos EUA. Ele propôs uma limpeza étnica na Faixa de Gaza. Quer dizer, a expulsão dos palestinos do seu território? Até onde vão os limites de Donald Trump?”, disse. O parlamentar ainda reforçou a importância da luta e da mobilização popular pelo direito ao voto e citou a PEC 347/2013 - Aqui vivo, aqui voto, da qual é autor, e que concede direitos políticos a imigrantes residentes no Brasil. “Vamos pensar em organizar comitês em outras cidades do Brasil, porque é necessária uma resistência", concluiu Zarattini.
Carla Mustafá representante do Núcleo de Direitos de Migrantes e Refugiados da OAB/SP, as medidas restritivas adotadas pelo governo trumpista são uma violação clara dos Direitos Humanos e para evitar que ações como essas não se repitam devem partir de um esforço coletivo. “Infelizmente, estamos aqui para discutir a questão dos brasileiros deportados em massa. Essa política muitas vezes é baseada no discurso de ódio, xenofobia e racismo. É importante lutar para que migrar seja cada vez mais reconhecido como direito humano. Mustafá reiterou o compromisso com a causa migratória e colocou a entidade à disposição.
Shabir Ahmad Niazi, da Organização de Resgate de Refugiados Afegãos, lembrou da sua chegada no país e seus primeiros passos na ajuda a migrantes africanos. O ativista destacou a relevância do ato em ser mais uma voz contra as deportações sem levar em consideração a dignidade humana. “Discriminação pela política de migração não pode ser usada como arma de deportação forçada. Nós, ativistas, organizações sociais e defensoras dos direitos humanos, estamos aqui para dizer: Basta”, enfatizou Niazi.
Fedo Bacourt, ativista da USIH, parabenizou a postura adotada pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao receber com dignidade os deportados brasileiros e lamentou as medidas adotadas por Donald Trump contra os imigrantes. “Congratulo, primeiramente, o presidente Lula, que recebeu os brasileiros com grandeza e retirou as algemas deles. Trump, há um mês no poder, chegou com mensagens de ódio e racismo”, disse.
Roque Renato Patussi, da organização Cami, destacou que o tema dos migrantes é muito sensível e delicado para ser debatido, uma vez que a humanidade encontra-se em constante mobilidade por diversos motivos. “A humanidade está em movimento, seja por causas econômicas ou fenômenos naturais, mas especialmente, por expulsões. Eu gostaria de pedir um aplauso a todos os imigrantes e refugiados do mundo inteiro que rompem fronteiras para buscar um mundo unido”, concluiu.
Entidades ligadas à luta sindical uniram-se ao ato. Edson Bertoldo, pela CUT-SP, e Cleonice Caetano Souza, pela UGT/Sindicato dos Comerciários, participaram do manifesto. Bertolo destacou a importância de denunciar as violações dos direitos trabalhistas. “Tomamos conhecimento de que alguns empresários se valem da condição dos migrantes para explorar essa situação e veem oportunismo em explorar essa mão de obra por 10, 12 horas de trabalho”, finalizou. Para a sindicalista Cleonice Caetano de Souza, é necessário seguir a Declaração Universal dos Direitos Humanos. “Estamos aqui para reafirmar um princípio que deveria ser inegociável, que é o direito de migrar. É preciso reafirmar a busca de melhores condições de vida e de oportunidade de segurança”, explicou.
No evento, foi feita a leitura de manifestos pela ONG Mães da Resistência, entidade de apoio à causa LGBTQIAPN+ e pela procuradora do Ministério Público e professora da Escola Superior do MPU, Cristiane Maria Sbalqueiro Lopes, que, no ato, foi representada pela voluntária do CDHIC Luciana Garcia, que leu o documento para os presentes.
Paulo Illes, coordenador geral da Rede Sem Fronteiras e diretor executivo do CDHIC, fechou os debates reconhecendo os grandiosos avanços do Brasil com relação à política migratória. No entanto, deixou claro que é necessário construir e modernizar tais políticas. “Reconhecemos que o Brasil tem dado passos extraordinários nos últimos anos. Atualmente, temos acordos de livre trânsito, de mobilidade, com os países lusófonos e os vistos humanitários. Enfim, mesmo assim, todos eles precisam ser reavaliados e adequados à realidade”, explicou Iles.
Ao final dos trabalhos, foi encaminhada, de forma coletiva, a elaboração de uma carta destinada ao Deputado Federal Carlos Zarattini, solicitando seu apoio para a proposição de uma audiência com a presença do Ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski. O objetivo da audiência é discutir as deportações em massa de migrantes pelo governo Trump e as recentes medidas adotadas pelo governo brasileiro, incluindo as mudanças nos procedimentos para solicitação de refúgio, as portarias que regulamentaram o patrocínio comunitário no país e a Política Nacional de Migrações, Refúgio e Apatridia. Todos os presentes manifestaram apoio ao envio da carta.
CONFIRA NA ÍNTEGRA OS MANIFESTOS
CARTA COLETIVA
Nós, organizações, movimentos, coletivos e centrais sindicais, reunidos no Ato contra as deportações de migrantes promovidas pelo governo Trump, realizado no dia 07 de fevereiro de 2025, na Câmara Municipal de São Paulo, expressamos nossa profunda preocupação com as políticas anti-migratórias em nível global e suas consequências para o Brasil e América Latina.
Diante disso, como acordado durante a plenária, vimos respeitosamente solicitar seu apoio como parlamentar comprometido com a temática migratória para a realização de uma audiência, em São Paulo, Capital, com a presença do Ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, acerca das deportações em massa de migrantes pelo governo Trump e as recentes medidas adotadas pelo governo brasileiro, incluindo as mudanças nos procedimentos para solicitação de refúgio, as portarias que regulamentaram o patrocínio comunitário no país e a Política Nacional de Migrações, Refúgio e Apatridia.
Defendemos que o Brasil se mantenha fiel ao seu papel humanitário, com políticas migratórias que garantam os direitos fundamentais, o acesso a serviços públicos e a segurança para todas as pessoas migrantes, combatendo a xenofobia e o racismo. É essencial que o Brasil se comprometa a ser um exemplo de solidariedade e respeito aos direitos humanos para os demais países da região e do continente.
MÃES DA RESISTÊNCIA
Nós, Mães da Resistência, organização que acolhe e defende as pessoas LGBTQIAPN+ e as suas famílias, levantamos nossas vozes em uníssono contra a crueldade e a injustiça das deportações promovidas pelo governo Trump. É inaceitável que famílias sejam separadas, que sonhos sejam destruídos e que vidas sejam arrancadas de seus lares, sob o pretexto de uma política de ódio e intolerância.
Defendemos o direito de migrar, reconhecendo que a busca por uma vida melhor é um direito fundamental, independente de nacionalidade, raça, credo, gênero, orientação sexual e identidade de gênero. É fundamental lembrar que os EUA são um país construído por imigrantes, cuja economia é movimentada por essa força de trabalho diversa e multicultural. As políticas de deportação do governo Trump são um ataque aos direitos humanos, à dignidade e à esperança de milhares de pessoas que buscam uma vida livre de opressão, violência e miséria.
As Mães da Resistência se solidarizam com todos os imigrantes que têm sido alvo de perseguição e deportação indiscriminada e se colocam à disposição para oferecer apoio e acolhimento. Juntas, juntos e juntes vamos lutar por um mundo mais justo e humano, onde a solidariedade, a compaixão e o respeito prevaleçam sobre o ódio e a intolerância!
Cristiane Maria Sbalqueiro Lopes, Procuradora do Ministério Público do Trabalho e professora da Escola Superior do MPU
É vergonhoso tratar seres humanos que migram como se fossem pessoas perigosas ou deletérias para o país dominante. Todas as pessoas humanas merecem respeito pelo simples fato de serem humanas: isso é dignidade. Não podemos nos calar diante da brutalidade do tratamento discriminatório que está sendo dado aos migrantes por capricho autoritário. A instigação ao ódio e segregação poderá levar a atos extremos de ódio. Quem instiga o ódio é responsável por suas consequências, ainda que elas venham por meio de atos de terceiros. Como brasileiros que somos, devemos nos manter firmes na defesa dos princípios de nossa lei de migrações e assumir com vontade os espaços políticos da defesa dos direitos humanos. E dizer NÃO ao ódio e à discriminação.
Rodapé
Entidade realizadoras:
Uniram-se ao Ato Político Contra as Deportações de Migrantes pelo Governo Trump: Rede Sem Fronteira, Caritas SP, CAMI - Centro de Apoio e Pastoral do Migrante, Sefras, CDHIC - Centro de Direitos Humanos e Cidadania do Imigrante, CUT - Central Única dos Trabalhadores, Grito do Excluídos, Organização de Resgate de Refugiados Afegãos, UGT - União Geral dos Trabalhadores, Sindicato dos Comerciários, Núcleo de Direito de Imigrantes e Refugiados da OAB/SP, USIH - União Social dos Imigrantes Haitianos, Associação Brasileiro-Chilena de Amizade, Fórum Internacional de Jovens com as Embaixadas da África Ocidental e Associação do Coletivo de Leitoras de Paulo Freire na França.
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